empreendedorismo social

Empreendedorismo social: o propósito como ponto de partida

Se compararmos com o cenário de décadas atrás, nunca foi tão fácil abrir uma empresa. No mundo todo, o acesso ao crédito foi ampliado e, graças à internet, conhecimento e comunicação foram democratizados. Por conta disso, a concorrência também nunca foi tão grande.

 

É uma realidade que leva muita gente a crer que todas as áreas nas quais se pense em empreender já estão ocupadas por companhias com uma certa trajetória, conhecidas pelo público.

 

Mas não é bem assim. Se ampliarmos nosso olhar além do óbvio, vamos perceber que nossa sociedade ainda tem uma série de questões mal resolvidas:

 

  • Acesso à saúde e educação;
  • Desigualdade econômica;
  • Desemprego;
  • Manejo de resíduos;
  • Geração de energia;
  • Aquecimento global;
  • Mobilidade urbana.

 

Mesmo as nações mais ricas têm deficiências evidentes nessas e em outras tantas áreas. O problema é que poucos empreendedores enxergam aí oportunidades de negócio.

 

Veja bem, não estamos falando em se aproveitar das mazelas da população, explorando-as comercialmente, mas justamente do contrário: colaborar para acabar com elas. Porque esperar que o poder público se encarregue disso não é a única opção.

 

Neste artigo, vamos mostrar como o empreendedorismo social é capaz de fazer uma diferença positiva frente a esses problemas e ainda gerar lucro.

Lucro não é o propósito

Alguns leitores podem achar contraditório falarmos em lucro e iniciativa social para descrever o mesmo empreendimento. Afinal, convencionalmente, as organizações são separadas em três grupos distintos:

 

  • Primeiro setor: o poder público, que deve agir em prol do bem comum e é financiado pelo dinheiro da população.
  • Segundo setor: a iniciativa privada, empresas que desenvolvem e comercializam produtos e serviços visando o lucro.
  • Terceiro setor: composto pelas organizações não governamentais (ONGs) e outras instituições de caráter social e sem fins lucrativos.

 

Hoje, é cada vez mais comum ouvir falar de empresas do setor 2.5, ou seja, que ficam no meio do caminho entre o segundo e o terceiro setor, pois têm finalidade social e visam lucro ao mesmo tempo.

 

Como isso é possível? O segredo de tudo está o propósito. Sim, o lucro se faz presente no empreendedorismo social, mas a diferença é que ele não é o centro de tudo. Em uma empresa 2.5 é o social que vem primeiro.

O “porquê” em primeiro lugar

O consultor britânico Simon Sinek bolou uma maneira simples e inspiradora para explicar a importância do propósito. Segundo ele, todas as pessoas e organizações com grande potencial para inovar e liderar seguem um padrão, que ele codificou no que chamou de Golden Circle. A ideia foi apresentada em um famoso TED Talk em 2009:

Golden Circle

Traduzindo: Why = Por quê?; How = Como?; What: O quê?.

 

É interessante notar que Why também pode ser traduzido como “porquê”. Assim, junto e com acento, ele é um substantivo que significa causa, motivo. O que nos remete novamente a ele, o propósito.

 

A ideia do Golden Circle é mostrar como algumas organizações são capazes de inspirar e outras não. E a conclusão é que, enquanto a maioria começa pela questão mais fácil — respondendo primeiro “por que”, depois “como” e por último “o que” —, líderes inspiradores fazem o contrário: pensam, agem e se comunicam de dentro para fora.

 

Quer um exemplo? Sinek apresenta da seguinte maneira o jeito Apple de fazer as coisas:

 

  • Por quê? Acreditamos em desafiar o status quo e em pensar de forma diferente.
  • Como? Com produtos bem projetados, fáceis de usar e com uma interface amigável.
  • O quê? Acabamos fazendo excelentes computadores. Quer comprar um?

 

Se usasse a lógica de outros fabricantes de computadores, a Apple iria se comunicar assim:

 

  • O quê? Nós fazemos ótimos computadores.
  • Como? Eles são lindamente projetados, fáceis de usar e têm uma interface amigável. Quer comprar um?

 

Sequer chegaria ao porquê e perderia, portanto, seu grande diferencial.

E o empreendedorismo social?

Note que, ao falar do Golden Circle e da Apple, em nenhum momento citamos o lucro, porque ele não é o propósito, é sempre o resultado. É claro que isso não é o suficiente para tornar a icônica fabricante dos MacBooks, iPhones e iPads em um exemplo de empresa do setor 2.5, por mais que pensemos que esses produtos tornam a nossa vida melhor.

 

O que acontece é que, no empreendedorismo social, pensar de dentro para fora do Golden Circle é uma necessidade, não um diferencial de mercado. E a resposta para o WHY sempre será uma causa social.

 

Para que você entenda melhor, vamos apresentar uma empresa porto-alegrense, a Revoada, que cria produtos estilosos como bolsas, mochilas e carteiras a partir de materiais como câmaras de pneus inutilizadas e náilons de guarda-chuvas quebrados.

Revoada
Revoada produz bolsas, carteiras e mochilas com materiais reutilizados. Foto: Facebook/Divulgação

Analisando-a a partir do Golden Circle, percebemos a empresa pensa, age e se comunica de dentro para fora. Veja:

 

  • Por quê? Queremos diminuir o impacto ambiental e valorizar o trabalho dos recicladores.
  • Como? Usamos o design para dar um novo propósito ao lixo.
  • O quê? Criamos lindas bolsas, mochilas e carteiras. Quer comprar uma?

 

O propósito está na primeira resposta. E na última está o lucro. Eis o empreendedorismo social, eis o setor 2.5: o lucro pode não ser o objetivo primeiro, mas o negócio tem a intenção de obtê-lo, sim.

 

Antes disso, porém, está a meta de causar um impacto social positivo. No final, essa e outras empresas mostram é que é possível conciliar as duas coisas.

Consumidores conscientes

A empresa que tem um propósito social e consegue fazer com que essa identidade seja reconhecida pelo público externo entra em um círculo virtuoso. Porque os consumidores estão cada vez mais atentos a isso.

 

Em uma pesquisa recente, a Sprout Social entrevistou mais de mil consumidores americanos sobre qual o posicionamento que esperam das marcas frente aos grandes problemas da sociedade. Dois terços responderam que querem marcas engajadas em questões políticas e sociais.

 

No Brasil, em estudo da Edelman Earned Brand, divulgado em novembro de 2017, 56% dos entrevistados afirmam que consomem ou boicotam marcas segundo seu posicionamento diante de questões sociais relevantes.

 

Felizmente, companhias com grande potencial de investimento têm reconhecido essa nova realidade e, se não incorporam um propósito social em seu produto ou serviço, pelo menos incentivam empresas e instituições que fazem isso.

 

A marca de whisky Chivas, por exemplo, tem um concurso anual chamado Chivas Venture, que premia com US$ 1 milhão startups que impactam o mundo de maneira positiva. Na edição de 2018, a porto-alegrense Revoada representou o Brasil na final mundial.

 

Já a Oi mantém o instituto Oi Futuro, que investe em ações inovadoras e colaborativas que melhoram a vida das pessoas e da sociedade das áreas de educação, cultura, inovação social e esporte. Outra iniciativa que podemos destacar é o Instituto C&A, que dá apoio técnico e financeiro para fortalecer organizações e outros agentes de mudança.

Todo mundo pode ser um agente da mudança

Você já parou para pensar que não precisa ser um investidor nem um empreendedor social para colaborar? Basta assumir o desafio de ser um consumidor mais consciente, prestando atenção no propósito das marcas consumidas.

 

Se as ideias comunicadas não se manifestam no modo de agir da organização, o propósito não passa de um marketing raso — ou propaganda enganosa para alguns. Para identificar quem se preocupa com o social de maneira verdadeira, é preciso se preocupar também. E apurar os sentidos.

 

Ficou com alguma dúvida ou tem algum comentário a fazer sobre o empreendedorismo social e as empresas do setor 2.5? Deixe um comentário abaixo ou entre em contato conosco.

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