Há quem enxergue a cidade como uma série de terrenos privados, entre os quais passam as vias urbanas. Ou seja, a rua é uma coisa e a propriedade particular é outra. E o passeio público (calçadas) é visto como mais um elemento à parte, ou como mera extensão do imóvel.
O conceito de permeabilidade urbana propõe pensar na cidade de uma outra maneira: como um ambiente de integração. Segundo o dicionário Michaelis, permeável é aquilo “que pode ser atravessado, transpassado”.
Como a terra. Quando um agricultor irriga sua plantação, a água não fica acumulada sobre a superfície, mas é absorvida pelo solo, que é poroso e não maciço (impermeável) como o asfalto e concreto.
Quando o assunto é permeabilidade urbana, estamos utilizando o termo como metáfora para definir uma qualidade muito interessante de determinadas construções: a integração com o espaço público e a visibilidade de parte de seu interior.
É como se o prédio fosse a terra e a água fosse o espaço público. Uma construção permeável é aquela que é irrigada por áreas de livre circulação, onde o fluxo de pessoas é facilitado e estimulado.
Em um edifício permeável, o prédio se mistura com a rua e a rua se mistura com o prédio. Há uma interação da construção com o seu entorno que não é por acaso, mas sim deliberada. Mesmo que seja um imóvel residencial, que não é aberto à visitação de estranhos, essa harmonia é importante.
A residência pode contribuir para melhorar a qualidade de vida e a experiência cotidiana de quem circula pelo local. O resultado é um local mais movimentado e, consequentemente, mais seguro, o que beneficia a todos, moradores e transeuntes.
É importante observar que, assim como o projeto do edifício leva em conta o que está à sua volta, a presença da construção também influenciará o entorno. Por isso, tudo deve ser planejado com muita responsabilidade, respeitando a vida que acontece ali e pensando em estimular mudanças positivas na rua.
Um ótimo exemplo de prédio permeável é o Museu de Arte de São Paulo (Masp), localizado na Avenida Paulista. Além de ser um dos mais importantes museus do Brasil, está entre os principais exemplares da arquitetura brasileira.
O terreno para a construção do Masp, que é uma instituição privada, foi doado pela prefeitura com a condição de que fosse mantida a vista para o centro da cidade, a partir do mirante 9 de julho.
A solução encontrada pela arquiteta Lina Bo Bardi foi fazer o prédio suspenso, de modo que o espaço público da calçada da Avenida Paulista e o acesso ao mirante fossem mantidos. A área localizada abaixo do museu ficou conhecida como vão do Masp, um lugar bastante vivo e movimentado.
O Copan, outra das construções mais famosas do Brasil, é mais um exemplo de permeabilidade urbana. O térreo do icônico prédio projetado no centro de São Paulo por Oscar Niemeyer é uma grande galeria com comércio e serviços, que pode ser atravessada.
Combinado com as passagens existentes nos terraços do edifício Itália (segundo mais alto da capital paulista) e edifício Conde Penteado, forma uma quadra permeável, de intenso movimento de pedestres.
Para que o ambiente seja realmente convidativo e acessível, é preciso reduzir os obstáculos físicos. Em Life Between Buildings (A Vida Entre Edifícios), Jan Gehl, arquiteto dinamarquês, escreveu que é importante que seja fácil entrar e sair das habitações. Segundo ele, quando a passagem é difícil – exigindo o uso de escadas ou elevadores, por exemplo – o número de visitas cai.
Mesmo parques que não são cercados podem ser mal planejados nesse sentido. Apesar de serem espaços abertos, às vezes possuem muitos canteiros funcionando como barreiras (limitando o número de entradas) em vez de terem a grama se encontrando diretamente com o calçamento do passeio público por toda a extensão do parque.
Para o comércio, a motivação para desenvolver projetos permeáveis é muito clara. Como já dissemos, um prédio que está integrado com o espaço público estimula a circulação de pessoas. Portanto, maior será o número de clientes em potencial passando pelo local. Tente lembrar: você nunca deixou de entrar em uma loja porque imaginou que não se sentiria confortável dentro dela?
Já nos prédios de instituições públicas, como câmaras legislativas, fóruns e outros tantos, utilizar os princípios da permeabilidade urbana é fomentar o sentimento de cidadania entre a sociedade. Se um órgão é público, ele deve funcionar em prol da comunidade, portanto a população deve ser bem-vinda em seus prédios.
Em entrevista à revista aU, o renomado arquiteto Fábio Penteado (falecido em 2011) contou uma experiência que tem muito a ver com isso. Para desenvolver o projeto do Fórum de Araras (cidade do interior paulista), Penteado visitou um já construído, em uma cidade vizinha. A impressão causada foi forte.
“Procurei usufruí-lo como um homem comum, um trabalhador que ali chegava por obrigação, para tirar um documento ou registrar um filho, e me senti muito triste. A impressão era que quem entrasse ali já estava ‘condenado’, à mercê da má vontade de um guarda ou do garoto do cartório, que se sente uma autoridade. A minha idéia, então, foi abrir o espaço e dissipar aquela sensação de medo e humilhação.”
Penteado projetou um prédio que, originalmente, não tinha portas nem saguão. Era uma espécie de praça coberta, na qual as pessoas podiam sentar e conversar. Hoje, a construção abriga a Câmara de Vereadores do município.
A permeabilidade urbana não é apenas a capacidade de uma construção de ser transposta. Antes disso, ela deve ser vista. Um prédio permeável permite o contato visual dos transeuntes com o seu interior. Em vez de muros, possui por grades, alambrados ou, melhor ainda, jardins. Em vez de vidros refletivos, tem brises e cobogós.
Jan Gehl, no mesmo livro citado anteriormente, afirma que o contato entre o que acontece no espaço público e dentro dos edifícios enriquece as possibilidades de experiências em ambas as direções. O resultado é um maior movimento, fator que tem relação direta com a segurança do local.
Você já tentou caminhar em uma quadra que possui um muro alto em toda a sua extensão? Muitos condomínios são construídos assim para garantir a segurança de quem está dentro, sem pensar em contribuir para uma rua, quadra, bairro e cidade mais segura.
“Tu caminhas por dois quilômetros e ninguém te vê, ninguém te cuida. Esse é um problema de planejamento urbano e construção da cidade, pois são as pessoas que tornam a cidade segura”, opina Adalberto da Rocha Heck, coordenador do curso de Arquitetura e Urbanismo da Unisinos Porto Alegre.
Assim, pensar nessa permeabilidade visual é, também, uma maneira de tornar a rua mais movimentada, o que leva a um círculo virtuoso. Segundo Gehl, a própria animação de uma rua atrai mais pessoas. Não são apenas as crianças que se interessam por lugares em que outros pequenos estão brincando – Os adultos também são assim.
Concorda com esse ponto de vista e acha que construções mais permeáveis ajudam a construir uma cidade melhor? Então compartilhe o artigo com seus amigos nas redes sociais. Se ainda tem dúvidas sobre a permeabilidade urbana, deixe um comentário abaixo 🙂
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Excelente matéria, por mais conteúdos de estratégias de arquitetura pra contribuir na segurança de residências, comércios, condomínios.
Parabéns pela matéria, educativa e esclarecedora!